Pular para o conteúdo principal

Publicado em: 30/06/2016

Revitalizando a Atividade de Auditoria Fiscal

Por Ubiratan Machado de Castro Júnior*

Estou lotado na atividade de auditoria fiscal desde janeiro de 2010, quando fui exercer minhas atividades laborais na cidade de Juazeiro do Norte. Lembro-me que em 2010 fazíamos auditorias fiscais amplas previamente planejadas, disponíveis em um banco de dados de contribuintes e que as mesmas referentes exercício de 2007; no ano seguinte, homologávamos o exercício de 2008, e daí por diante, de forma que sempre realizávamos as auditorias fiscais em regra 03 (três) anos após a ocorrência dos fatos geradores tributáveis, e o banco de dados de contribuintes disponível para a realização de auditorias plenas era renovado ano após ano.

Nos dias atuais, em 2016, a realidade é bastante diferente, o banco de dados de contribuintes a fiscalizar não é renovado há anos, estando disponível apenas aos supervisores dos núcleos setoriais da CESEC o banco referente ao exercício de 2011 - o que ainda restou -, à beira do precipício da decadência tributária. No caso do núcleo setorial de produtos automotivos, onde estou atualmente lotado, a "raspa do tacho" das empresas disponíveis para auditar consiste basicamente em postos revendedores de combustíveis e de botijões de gás, cujo faturamento declarado é relativamente baixo e cujos produtos comercializados já tiveram ICMS recolhido por substituição tributária na origem. E o banco de contribuintes de 2012?

O fato descrito acima indica a clarividente preterição da atividade de auditoria fiscal dos contribuintes do ICMS do Estado por parte da administração fazendária cearense.

A ausência de arrecadação imediata dos créditos tributários constituídos é o argumento que mais figura como justificativa por parte dos gestores para a prescindibilidade das auditorias fiscais, afinal, lavrar autos de infração serve somente para "inchar a dívida ativa", pelo menos na opinião de alguns.

Contudo, a função da auditoria fiscal é examinar a acuracidade das informações prestadas pelos contribuintes e verificar se estes declararam, calcularam e cumpriram corretamente suas obrigações tributárias. É o procedimento realizado pela administração tributária capaz de aferir o adimplemento das obrigações fiscais. Sem a auditoria fiscal, o contribuinte se sentirá plenamente à vontade para omitir fatos tributáveis e declarar apenas o que se dispuser.

Respeito os defensores do Monitoramento Fiscal, mas mesmo abstraindo dos aspectos ilegais (ex: concessão do benefício da confissão espontânea após o início de procedimento fiscal e de anistia de multas tributárias por ato infralegal, cobrança de débitos inscritos em dívida ativa), o Monitoramento Fiscal não é procedimento apto a substituir a Auditoria Fiscal. O monitoramento da forma que está posto retira do auditor fiscal a prerrogativa de autoridade administrativa e limita o auditor a notificar o contribuinte a recolher créditos tributários constituídos previamente registrados nos sistemas da SEFAZ. Mesmo nos casos excepcionais em que o auditor realiza através do monitoramento apuração de imposto devido que não conste em sistema (ex: falta de recolhimento de ICMS diferencial de alíquotas), o procedimento não permite a constituição de ofício do crédito tributário pelo lançamento. Caso o contribuinte notificado não recolha o imposto apurado - mesmo com todas as benesses da espontaneidade imprópria -, o lançamento dependerá necessariamente da emissão de um Mandado de Ação Fiscal para realização de auditoria.

Há muito o que ser discutido para melhorar a eficiência e a efetividade deste processo. As limitações de ordem legal e administrativa existentes no processo de cobrança dos débitos fiscais - inclusive na execução fiscal - é inversamente proporcional à competência dos contribuintes ricos e poderosos em se livrar das exigências tributárias, seja por meio de influência política exercida nas esferas legislativa, administrativa e ou de julgamento ou, em último caso, através de artifícios sofisticados de "blindagem patrimonial", que os tornam imunes à execução.

A existência destes entraves, entretanto, não é motivo para desanimar, precisamos progredir. Enquanto não damos passos mais largos em direção à melhoria dos processos de cobrança de créditos tributários, podemos dar passos curtos em direção à revitalização da atividade de auditoria fiscal. Um destes seria a liberação do banco de contribuintes para realização de auditorias fiscais plenas referentes aos exercícios 2012, banco este que, por razões obscuras e inexplicáveis, ainda não foi disponibilizado.

Contudo, este seria apenas um (re)começo. A realização de auditorias fiscais não deve estar sujeita ao governante ou secretário de plantão, mas deve ser uma política de Estado. Tal objetivo somente será alcançado no Estado do Ceará com a conquista da autonomia da administração tributária, autonomia para que tome suas próprias decisões não primariamente em considerações políticas, mas em considerações jurídicas, de profissionalismo e de efetividade. Urge o surgimento de uma lei orgânica da administração tributária que conceda autonomia financeira, orçamentária e funcional e blinde o Fisco das ingerências políticas.

*Auditor Fiscal da Receita Estadual, Diretor de Assuntos Jurídicos da AUDITECE