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Publicado em: 02/06/2014

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PODER PÚBLICO - Controle social precário favorece desperdícios

A falta de atenção aos gastos públicos facilita o mau uso dos recursos e contribui para o aumento dos tributos

Racionalizar os recursos das máquinas públicas é um desafio longe de ser plenamente alcançado nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Professores de administração e de economia do Ceará relatam que a falta de zelo com a verba pública tem uma relação direta com a alta carga tributária do Brasil, que se ajusta ao alto custo do poder público. Além disso, as ferramentas de controle social pouco são utilizadas para fiscalizar governos, tribunais e casas legislativas.

Para 2014, o Governo do Estado do Ceará apresentou na Lei Orçamentária Anual (LOA) previsão de desembolsar R$ 21 bilhões. As cifras são aplicadas em rubricas como saúde, educação e segurança, mas também mantêm toda a estrutura administrativa do Palácio da Abolição, contratação de servidores e incluem os orçamentos do Legislativo, estimado em R$ 478 milhões, e do Judiciário, que pode chegar a R$ 814 milhões.

O economista Andrei Simonassi, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), diz acreditar que as iniciativas que propiciam a sociedade a acompanhar a utilização dos recursos públicos contribuem para a democracia. Porém, ele opina que não há adesão para ferramentas como os portais da transparência, que devem divulgar dados das gestões públicas em tempo real. "A nossa população está muito aquém do desejável para que o controle tenha eficácia", diz.

Pouco informado

"O público é muito pouco informado e, em épocas como essa, que se fala em eleições e Copa do Mundo, ninguém vai se dedicar a saber como estão sendo gastos os recursos em cada esfera de governo e em todas as rubricas", completa o especialista.

Simonassi explica que os gastos desordenados da máquina pública têm impacto na elevação dos impostos. Dessa forma, a equação se estrutura no sentido de adaptar tributos pagos pela população aos custos do poder público e não o contrário. "Enquanto há falta de controle social e disciplina nos gastos públicos do Brasil, não tem redução da carga tributária excessiva, principalmente para o trabalhador. Aumentam os impostos para justificar os gastos", elucida.

Amparados pela certeza de que não serão incomodados pela fiscalização popular, gestores mantêm benesses e despesas excessivas, acrescenta Andrei Simonassi. "A negligência e a falta de conscientização da população fazem com que esses gastos cresçam de forma desorganizada, gerando uma miopia que não enxerga o quanto de imposto se está pagando", pontua.

Professor do Departamento de Economia Aplicada da UFC, Almir Bittencourt avalia que uma das válvulas de desperdício de verba é a execução de obras públicas. Com projetos falhos e orçamentos pouco realistas, os empreendimentos "nunca conseguem acabar" e são mais onerosos do que o planejado. "Os orçamentos dão margem para que o Estado tenha um excesso de custos. A própria despesa de custeio da máquina pública vem aumentando", detalha.

Encarecimento

Bittencourt ressalta que esse encarecimento da estrutura administrativa é ampliado por privilégios custeados no âmbito do poder público. "Há uma série de benefícios associados à remuneração, que só elevam a despesa pública, como concessão de passagens a assessores, gastos de gabinete, etc", exemplifica.

Para o especialista, a sociedade brasileira não está esclarecida para controlar os recursos públicos. "As punições que existem são brandas e os agentes públicos vão driblando a população, porque sabem que não há eficácia nas punições", diz. "Não existe ainda uma cultura de atuação efetiva, não há canais suficientemente claros para a população exercer sua função social de controle das despesas", conclui.

Na avaliação de Paulo Roberto Nunes, professor de contabilidade pública e controladoria da Universidade de Fortaleza (Unifor), existem pelo menos dois caminhos para racionalizar recursos na administração: centralização e planejamento das despesas de um órgão e monitoramento dos gastos realizados.

"O gasto público será melhorado quando o planejamento for feito de maneira mais adequada e precisa. Isso vai avançar quando houver mais qualificação dos profissionais", destaca Paulo Roberto, que também é auditor interno da Controladoria Geral do Estado (CGE), onde exerce cargo de secretário executivo.

O docente salienta que, para haver controle social efetivo, é necessário que as informações estejam disponíveis de forma inteligível ao cidadão. "Mas isso não é suficiente, porque as pessoas precisam estar motivadas a buscar as informações e boa parte delas não se sente motivada a isso", declara, acrescentando: "quem exerce essa função geralmente são as ONGs, mas mesmo assim não conseguem motivar a grande maioria da sociedade a fazer esse papel".

Paulo Roberto Nunes frisa que a inclusão digital não tem sido usada para o fortalecimento da coletividade. "A maioria das pessoas usa a Internet para suprir as demandas individuais. Eu presumo que o controle social ainda é muito baixo. Isso tudo faz parte do processo de cidadanização", aponta.

SAIBA MAIS

Receita

O orçamento da União para o exercício de 2014 é estimado em R$ 2,3 trilhões. Desse montante, cerca de R$ 440 bilhões são referentes à receita tributária.

Ceará

O Estado do Ceará planeja gastar neste ano mais de R$ 21 bilhões. Saúde e Educação, que lideram as despesas, devem receber R$ 2,5 bilhões, cada, enquanto a Segurança Pública responderá por R$ 1,6 bilhão.

Cidadania

A Controladoria Geral do Estado (CGE) e a Secretaria Estadual da Educação (Seduc) desenvolvem há nove meses o projeto Educação Social, que proporciona palestras nas escolas públicas sobre exercício da cidadania e controle social.

 

Repórter: Lorena Alves

Fonte: Jornal Diário do Nordeste