MPF ajuíza ADI contra a Lei de Carreira do Fisco do Paraná
O Ministério Público Federal ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5510, com pedido de liminar, contra dispositivos de duas leis complementares do Paraná (LCs 92/2002 e 131/2010). Para o órgão, as normas promoveram transposição e provimento derivado de cargos públicos sem observar o requisito constitucional de aprovação prévia em concurso público.
O procurador-geral da República Rodrigo Janot, apontou que a LC 92/2002 efetivou provimento derivado de cargos públicos, sem nova aprovação em concurso público, pois transpôs para o cargo de auditor fiscal os ocupantes dos cargos de agente fiscal de três classes, com atribuições, grau de escolaridade e nível de complexidade inferiores. As informações são do STF.
A iniciativa foi tema de artigo do Auditor Fiscal da Receita Estadual de Minas Gerais, João Batista Soares, intitulado "O Déjà vu com MG é de arrepiar!". Leia abaixo.
O Déjà vu com MG é de arrepiar!
O Fisco do Paraná foi a fonte de inspiração para criação do grupo de articulação política em MG, cujo objetivo principal é angariar fundos, a fim de financiar campanhas eleitorais e buscar apoio de parlamentares para projetos corporativos dos Auditores Fiscais.
Nos idos de 2013 o grupo da SEF_MG[1] promoveu encontros com os auditores do Paraná para repasse de experiências e divulgação das conquistas obtidas pelo Fisco daquele Estado, após implantação desse projeto.
Parece que a influência do Fisco do Paraná nas Alterosas não se restringe à criação desse grupo de articulação política. Lá, como cá, houve a instituição de lei que promoveu ascensão funcional dos agentes fiscais para auditores, de forma derivada. Vejamos as últimas do momento!
Recentemente, em 29/04/16, o MPF ingressou com a ADI n° 5510 contra o Estado do Paraná, atacando a lei 92/02, que revogou a lei 7051/78, e ascendeu os agentes fiscais 2, 3 e 4 para auditores. A consolidação do "vício" deu-se com a lei 131/10, que revogou a lei 92/02 e mudou a denominação dos cargos. MPF discorre que "o vício reside exatamente na investidura em novo cargo público com atribuições, nível de complexidade e escolaridade diversa daquela parcialmente ocupada pelo servidor e para o qual seria necessária a aprovação em novo concurso público. A investidura deu-se mediante ascensão funcional", afirma a ADI. Em outro trecho da petição requer a repristinação da Lei 7051/78, pois as normas em comento "caracterizam provimento derivado de cargos públicos, sem observar o requisito constitucional de aprovação prévia em concurso público".
O MPF cita a Súmula 685 do STF, que diz que “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”. Argumenta ainda: “a chamada transformação que, visto implicar em alteração do título e das atribuições do cargo, configura novo provimento, a depender da exigência de concurso público, inscrita no art. 37, II da Constituição”.
Em seguida, o MPF diz que o único cargo que exigia nível superior, à época da lei 7051/78, era o de agente fiscal 1. Embora a escolaridade dos agentes fiscais 2, 3 e 4 fosse alterada para nível superior, em normas posteriores, suas atribuições sempre foram de menor complexidade, portanto, as leis 92/02 e 131/10 foram “estratagemas” para burlar o art. 37, inciso II da CF/88, alçando pessoas despreparadas para o desempenho de funções para as quais não prestaram concurso. Por fim, requer que os agentes fiscais 2, 3 e 4 retornem aos seus cargos originais. Veja a integra da ADI:http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/ADI5510.pdf/view.
Devido aos escândalos de corrupção envolvendo o Fisco do Paraná, a ADI ganhou destaque e grande repercussão da mídia local e nacional, sendo objeto, inclusive, de reportagem da filiada da Rede Globo, em 30/06/16. (Veja o link aqui).
A situação do Fisco de Minas Gerais só não é idêntica ao do Paraná porque nas Alterosas a ascensão do Agente para Auditor foi muito mais escandalosa. Afinal, os mentores da transformação eram ex-agentes, dentre os quais estão o Presidente do Sindifisco-MG e o então Subsecretário da Receita Estadual de MG. Ambos fizeram concurso para agente – exigência de nível médio de escolaridade – e, posteriormente, tentaram concurso para auditor (fiscal) – nível superior – mas foram reprovados.
A lei mineira nº 6762/75[2] – Do Quadro de Tributação, Fiscalização e Arrecadação de MG – QTFA –, em seu art. 14, §2º, inciso II, definia o acesso de agente para fiscal. A Resolução 527/76, regulamentação do art. 36 da lei 6762/75, comete à classe de fiscal maior nível de complexidade, responsabilidade e autonomia, razão da exigência de nível superior de escolaridade. O acesso funcional não é mais permitido.
O Fiscal de MG tem atribuições de auditoria e trabalhos complexos, a tal ponto que consta em suas atribuições a prerrogativa de “orientar, coordenar e controlar as atividades de tributação, fiscalização e arrecadação e aplicação da legislação tributária”. Ao Agente compete tarefas de menor complexidade – trânsito e volante/blitz -, com exigência de nível médio de escolaridade, que foi alterada para nível superior pela lei 11.176/93, mas mantendo as atribuições há muito previstas.
O que o Governo de Minas e alguns oportunistas de plantão[3] fizeram? Aprovaram a lei 15.464/05 e transformou o agente fiscal em auditor, enquadrando-o no mesmo nível do fiscal (auditor), a tal ponto que atualmente existe Auditor de nível médio de escolaridade, percebendo remuneração que supera os R$34,0 mil mensais.
Os agentes transformados em auditor não foram submetidos a treinamento, portanto, sem condições para assumirem a nova função. Resultado: têm-se pouco mais de 200 auditores com competência técnica para tal mister, em um contingente de 1.467 “auditores”.
Os agentes beneficiados com o acesso são despreparados para trabalhar na nova área. Assim, formaram um grupo, que assumiu o comando da SEF_MG. Hoje, a esmagadora maioria está em cargo comissionado, órgão central ou desempenhando atividades de baixa complexidade. É o vale tudo para não trabalhar na área ascendida.
O corolário não poderia ser outro, senão o caos na SEF_MG, tais como: burocratização, travamento e baixa produtividade do trabalho fiscal; modelo gerencial patrimonialista – laços de amizade, grupal ou familiar – pouco importando a competência técnico-profissional; alto remuneração para a gerência, em detrimento do trabalho de campo; falta de sintonia entre o corpo fiscal e a gerência, que adquiriu status de carreira paralela; ferramentas e ambiente de trabalho totalmente deteriorados, com alto índice de afastamento por problemas de saúde; aguçamento de visões corporativistas, em prejuízo do interesse público; remuneração incompatível para o cargo para o qual prestou concurso, com sérios prejuízos para o erário estadual; e, sem querer esgotar, o afastamento de sua missão institucional, com o desprezo na busca da justiça fiscal e o bem-estar social.
O SINFFAZFISCO[4] tem o dever legal e estatutário para que os princípios de isonomia, impessoalidade e moralidade sejam cumpridos pela SEF_MG. Já está em fase final a redação a ADI que será proposta em breve, a fim de que Súmula 685 do STF seja respeitada. O objeto da ação será semelhante aquele proposto pelo MPF contra o Estado do Paraná, qual seja, questionar o provimento derivado de cargo público, quando da ascensão do agente para auditor, conforme consta da lei 15.464/05, mormente em seu artigo 23.
Com essa medida, espera-se que o Estado Democrático de Direito seja restabelecido, com o retorno do agente fiscal para o seu assento original na lei 6.762/75, c/c a Resolução 527/76. Isso, sem dúvidas, ajudará a recuperar o prestígio, a imagem e a eficiência da nossa centenária SEF_MG.
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* Auditor Fiscal da Receita Estadual de Minas Gerais, desde dez/1999 e optante pela lei original.
Pós graduação em AUDITORIA (UFMG), em DIREITO TRIBUÁRIO (PUC_MG) e em CONTABILIDADE GOVERNAMENTAL (Cândido Mendes).
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[1] SEF_MG – Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais
[2] 6762/75 é a lei original da carreira do Fisco de MG. Ela ainda vige, pois fora dado opção para nela permanecer. Muitos o fizeram, mas brigam na justiça, pois o Estado não aceita. A Resolução 527/76, que define as atribuições e prerrogativas das classes, é a regulamentação do art. 36 da lei original. Tem status de lei, pois fora recepcionada pela CF/88, por força do seu art. 37, incisos I e II.
[3] Processo no TJMG nº 024.94.015.023-8, no qual sindicato pediu isonomia do Agente Fiscal de Tributos Estaduais – AFTE com o Fiscal de Tributos Estaduais – FTE. Na sentença, em 1996, além de determinar o pagamento de sucumbência de 3 salários mínimos, tamanho o absurdo do pleito, exararam expressões fortes como “somente o imaginário do absurdo, ou da ganância” ou “oportunistas de plantão”.
[4] SINFFAZFISCO_MG é o 1º sindicado a representar os servidores da SEF_MG. Atualmente são filiados a esse sindicato muitos auditores e gestores.
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Fonte: O BLOG do AFR
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