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Publicado em: 24/03/2014

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Desequilíbrios da economia apontam recessão no Brasil

24/03/2014.

O País passa por um momento de desaceleração do crescimento e possível entrada em um período de recessão. Apesar de o governo federal estar tentando não admitir esta situação, torna-se cada vez mais difícil cobrir o sol com a peneira, pois alguns números já começam a demonstrar o crescimento do problema. A venda de automóveis novos apresentou, na primeira metade deste mês, 30% de redução em relação a igual período do ano passado e, no acumulado de janeiro até agora, houve uma queda de 2,7% no total de unidades comercializadas - incluindo caminhões e ônibus. O mesmo começa a ocorrer em relação ao mercado imobiliário, que demonstra redução no número de novos empreendimentos em várias regiões do País.

De acordo com o professor de macroeconomia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Marcelo Callado, a situação que o ex-presidente Lula definiu como uma ‘marolinha’ - quando da crise financeira atingiu vários países, incluindo os Estados Unidos -, vem evoluindo e pode tornar-se uma ‘tsunami’. Ele disse que, para evitar o contágio da crise mundial de 2008 na economia brasileira, o governo federal alterou as políticas cambial, monetária e fiscal, no final daquele ano e início de 2009. Essa alteração foi capaz de evitar uma recessão profunda na economia brasileira na época (em 2009 houve uma recessão leve, de retração equivalente a 0,3% do PIB), mas aprofundou os desequilíbrios da economia brasileira. “As políticas fiscal e monetária dos últimos três anos só pioraram a situação e 2014 deveria ser um ano de ajuste, mas como é eleitoral, dificilmente o governo irá adotar as políticas necessárias. Com isso, o ajuste deve ocorrer no próximo ano, com uma recessão mais profunda ainda”, disse.

CONFIABILIDADE

Resgatar a credibilidade poderia ser uma forma fácil de mudar a política econômica e conseguir evitar uma recessão, ou a estagnação pela qual o País está passando, segundo o professor, mas o governo federal tem desperdiçado a sua credibilidade nos últimos três anos, praticando políticas que apenas ampliaram o problema. E ressalta que poupar é a melhor forma de as pessoas evitarem ser pegas de surpresa. “A poupança é sempre um mecanismo de defesa que as famílias utilizam para se precaver da deterioração econômica, em tempos de estagnação”, destacou. Sobre a retração verificada nos setores automobilísticos e da construção civil, diz que é a reação do mercado. “Imóveis e veículos são bens muito caros e que, quase sempre, só podem ser adquiridos via crédito. Nos últimos anos o governo aumentou, significativamente, o crédito para esses setores e criou uma política muito agressiva de estímulo à indústria automobilística. O resultado disso foi um excesso de capacidade instalada. A renda não cresceu na mesma proporção para sustentar este aumento. A tendência é que, nos próximos anos, os preços nesses setores se estabilizem, ou até caiam para adequar oferta à demanda”.

Como houve um aumento significativo na oferta de crédito, nos últimos anos, muitas pessoas, ao adquiri-lo, não calcularam muito bem o compromisso financeiro futuro que teriam. E isso gerou um aumento do endividamento. “É um reflexo do analfabetismo financeiro e econômico de uma parte significativa da nossa população. Enquanto ela não for educada a utilizar instrumentos financeiros como o crédito, de forma responsável, sempre haverá riscos de criação de bolhas financeiras e seus respectivos estouros. O estouro de uma bolha imobiliária, neste momento, certamente nos deixaria mais perto do fundo do poço”, enfatizou Callado.

Apesar disso, ele acha muito improvável que algo desse tipo possa vir a ocorrer em nosso País, pois a economia brasileira é uma das mais fechadas do mundo, e muito regulamentada. Lembrou que a recessão e estagnação na Europa ocorreram por causa da dificuldade dos países em patrocinarem reformas estruturais em seus mercados de trabalho e nas suas políticas previdenciárias e tributárias. O mesmo ocorre no Brasil que há, cerca de dez anos, não patrocina nenhuma reforma, em nenhum desses três setores.

“Não acho que seja possível o desenvolvimento de uma bolha imobiliária no Brasil, na mesma proporção que nos EUA. Infelizmente acho mais provável que o desenvolvimento siga o mesmo curso do que ocorreu na Europa. O fator mais importante para o crescimento econômico - a produtividade -, tem evoluído de forma muito tímida nos últimos anos. Isso limita o crescimento econômico a um teto de aproximadamente 2,5% ao ano, nos próximos anos, enquanto não tivermos reformas estruturais”, asseverou o economista.

POLÍTICA PROTECIONISTA PREJUDICA DESENVOLVIMENTO DO CEARÁ

Falando, especificamente sobre o Ceará - que tem registrado PIB acima da média nacional, nos últimos anos -, mas com o frustrante adiamento sucessivo do início das obras da refinaria Premium II da Petrobras, na área do Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CIPP), o professor acredita que não será possível manter estes resultados positivos, caso a crise venha a estourar. “A economia cearense poderia ter uma dinâmica mais independente da brasileira, caso a sua estrutura não fosse tão protecionista. O Estado do Ceará encontra-se numa posição geográfica privilegiada para ser um grande exportador de bens e serviços. Entretanto essa política extremamente protecionista, que faz com que o Brasil seja considerado um dos países mais fechados do mundo, limita a capacidade de trocas dos estados mais pobres com o exterior, diminuindo a dinâmica econômica dos mesmos”.

Sobre a inserção definitiva do nosso Estado, com o advento do Centro de Eventos, como uma das grandes opções para o turismo de negócios, o economista disse que ainda é preciso fazer muito, especialmente no que diz respeito a obras de mobilidade urbana, em Fortaleza. “Infelizmente, o turismo de negócios precisa de toda uma infraestrutura que a cidade de Fortaleza não possui: um aeroporto, portos e rodoviárias completamente integrados, com um serviço de transporte público que inclua trens, metrôs e ônibus. Além disso, o ambiente de negócios não consegue prosperar onde as pessoas não conseguem transitar e trocar de modais livremente. Isso não ocorre, atualmente, em Fortaleza, devido ao aumento da violência e a sensação de insegurança que a população vive. O turismo, provavelmente, vai continuar sendo, predominantemente, de lazer e não de negócios”, lamentou Marcelo Callado.

 

Fonte: O Estado Online (Jornal O Estado do Ceará)