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Publicado em: 19/11/2015

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STF proíbe gratificações que resultem em remuneração acima do teto

Verbas indenizatórias devem ser pagas, mesmo que ultrapassem o teto do funcionalismo

BRASÍLIA – O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira que servidores públicos não podem receber gratificações, adicionais por tempo de serviço e toda sorte de “penduricalhos” no contracheque que resultem, ao final, em remuneração superior ao teto do funcionalismo. O valor limite corresponde ao salário de ministro do STF, hoje fixado em R$ 33,7 mil. Portanto, a cifra que exceder esse limite deve ser cortada. Por outro lado, o tribunal autorizou que as verbas indenizatórias continuem sendo pagas normalmente, mesmo que ultrapassem o teto na remuneração final. Ou seja, na prática, haverá servidores recebendo mais que o teto.

As verbas indenizatórias compreendem todo tipo de benefício que o servidor recebe por ter tido alguma despesa. Estão na lista o auxílio-moradia, pagamento de escola para filhos de servidores ou, ainda, as diárias pagas aos servidores quando eles viajam a trabalho. Não há levantamento de quantos servidores ganham salário superior ao teto do funcionalismo. Mas havia em todo o país 2.262 processos paralisados sobre o assunto aguardando a decisão do STF.

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— É hora de acabarmos com vencimentos rabilongos, que incorporam uma série de vantagens e que teimam em não se submeter à Constituição, sobretudo em um momento de dificuldade econômica no país e de ajuste fiscal — disse o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, citando trecho da Constituição que proíbe vencimentos superiores ao teto.

A decisão foi tomada no julgamento de um processo em que um servidor aposentado de São Paulo alegava o direito adquirido aos “penduricalhos”, já que ele recebia os benefícios antes de 2003, data em que a Emenda Constitucional 41 determinou o corte de todos vencimentos superiores ao teto do funcionalismo. Por nove votos a um, os ministros do STF ponderaram que não há direito adquirido a um vencimento que fere a Constituição Federal. O processo tem repercussão geral – ou seja, a decisão deve ser aplicada por juízes de todo o Brasil na análise de casos semelhantes.

No caso concreto, o aposentado recebia adicionais tempo de serviço, quinquênios, sexta parte, prêmio de produtividade e gratificações. Não foi questionado o pagamento de verba indenizatória no processo, mas os ministros do STF deixaram claro que esse tipo de benefício não integra os vencimentos – portanto, podem ser pagos mesmo a servidores que já ganham o teto.

O servidor ganhou, em julgamento realizado no Tribunal de Justiça de São Paulo, o direito a continuar recebendo as gratificações, mesmo que o valor final, somado com o salário, ultrapassasse o teto. Para o tribunal, os benefícios tinham caráter permanente e integravam o patrimônio do servidor. O TJ entendeu que suprimir o pagamento dos benefícios seria uma forma de reduzir o salário, o que é proibido pela Constituição. O tribunal também alegou que o aposentado tinha direito adquirido às gratificações.

O governo de São Paulo recorreu ao STF para modificar a decisão e obteve vitória. A decisão da mais alta corte do país crava um ponto final à discussão, que se estendia há mais de dez anos, com decisões díspares de juízes – alguns concedendo o direito aos “penduricalhos” pagos antes de 2003, outros banindo o pagamento das gratificações que ultrapassavam o valor do teto.

A relatora do processo, ministra Rosa Weber, explicou que as vantagens recebidas acima do teto são ilegais – portanto, não há irredutibilidade de vencimentos ou desrespeito ao direito adquirido. Ela isentou, no entanto, o aposentado de restituir os valores aos cofres públicos, porque ele teria recebido o dinheiro de boa-fé. Segundo a ministra, a Emenda Constitucional 41 foi promulgada para corrigir distorções históricas nos salários, equilibrar as contas públicas e moralizar a folha de pagamento dos servidores públicos.

Entre os ministros presentes, apenas Marco Aurélio Mello discordou da tese. Embora defenda o teto constitucional, ele explicou que a Emenda 41 não tem efeito retroativo – portanto, quem já tinha os benefícios antes dela tem o direito de continuar recebendo. Ele deu o voto em nome da “segurança jurídica”. Argumentou que, em centenas de outros julgamentos, o STF havia autorizado o pagamento dessas gratificações.

O ministro Gilmar Mendes aproveitou o julgamento para protestar contra excessos nas vantagens recebidas por membros do Judiciário e do Ministério Público.

— O Ministério Público também se excedeu. O país imerso numa crise, discutindo se paga ou não o Bolsa Família, aí a gente discute se procurador pode ou não andar de primeira classe. Nós perdemos os paradigmas, perdemos os referenciais e precisamos sofrer um choque. Vamos acionar o desconfiômetro. Temos q fazer uma profunda autocritica, porque estamos obviamente dando mau exemplo e ficamos sem condições de olharmos para os nossos servidores e para os jurisdicionados diante dessas gambiarras que estamos produzindo, com liminares, decisões e portarias — afirmou.

Indignado, Gilmar também questionou como um procurador da República poderia “se olhar no espelho e dizer que é fiscal da lei” quando recebe esse tipo de vantagem. Ao fim do julgamento, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que estava presente à sessão, respondeu às acusações. Disse que o Ministério Público estava atento “para que exageros não aconteçam”. E esclareceu que ele, pessoalmente, não recebe auxílio-moradia, não viaja de primeira classe e não recebe nenhuma gratificação que eleve seu salário a patamar superior ao teto.

Fonte: O Globo