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As ideias defendidas nos artigos publicados neste Blog são de responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem a posição institucional da Auditece.

 

Publicado em: 23/09/2022

Ética Pública e Redes Sociais: mais um normativo da Sefaz-CE imposto sem planejamento e participação dos servidores?

A Comissão Setorial de Ética Pública (CSEP) da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará, com o objetivo de orientar os servidores fazendários sobre uso de redes sociais, emitiu, no último dia 12 de setembro, a recomendação nº 05, na qual reitera sua competência para estabelecer os referidos parâmetros de conduta e profere indicações para o comportamento dos servidores nas redes.

A Auditece, como legítima representante dos Auditores Fiscais da Receita Estadual do Ceará, avalia que os parâmetros determinados não conseguem imprimir clareza e dão margem à subjetividade e à parcialidade. Além disso, surpreende mais um normativo criado para influir sobre todos os servidores, sendo criado de forma unilateral. 

Antes de comentar aspectos do conteúdo da Recomendação, a Auditece questiona o porquê dos servidores não serem chamados a opinar sobre a construção de uma recomendação que requer adaptações às múltiplas funções exercidas na SEFAZ. A falta de democratização interna faz com que muitos normativos percam em conteúdo e, sobretudo, em legitimidade, fazendo com que o planejamento em gestão de pessoas seja, neste aspecto, comprometido.

No caso da Recomendação nº 05, de 12 de setembro de 2022, trata-se de uma “cópia” simples de parte da Resolução Nº 305 de 17/12/2019, do Conselho Nacional de Justiça - CNJ (Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3124), a qual estabelece os parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário.

Ou seja, além de não adaptar adequadamente o conteúdo normativo da Resolução Nº 305/19 do CNJ, a Sefaz-CE omitiu diversos pontos que poderiam ser abordados de forma mais clara, a fim de dar segurança e, inclusive, estimular o uso educativo e instrutivo das redes sociais por agentes do Fisco.

Há vasta regulamentação sobre o uso de redes sociais por advogados, carreiras policiais etc. Tal regulamentação precisa ser estudada e analisada em bloco para que, de forma sistemática, participativa e inclusiva, possa se adequar à realidade dos agentes do Fisco.

Sobre a nova Recomendação da Sefaz-CE, a Auditece preocupa-se, por exemplo, entre as recomendações de conduta determinadas, com normas como a seguir apontadas:

b) observar que a moderação, o decoro e a conduta respeitosa devem orientar todas as formas de atuação nas redes sociais; 
[...]
e) evitar manifestações que busquem autopromoção ou superexposição;”
f) evitar manifestações cujo conteúdo, por impróprio ou inadequado, possa repercutir negativamente ou atente contra a moralidade administrativa, observada sempre a prudência da linguagem; [..]

São normas com ampla indeterminação de linguagem e discricionariedade. Assim, perguntas como: O que é grau de moderação? O que pode ser considerado autopromoção ou superexposição? Quem vai avaliar se o conteúdo é inadequado ou se vai repercutir negativamente? Negativamente para quem ou para o quê? 
Nenhuma dessas, entre várias outras questões, é esclarecida no documento.

Para citar um pequeno exemplo, na última semana, pouco após a circulação da Recomendação nº 05/2022, por ocasião do aniversário da titular da Coordenadoria de Relações Institucionais (ARINS/SEFAZ-CE), uma repartição da Secretaria da Fazenda ganhou ambientação de festa, com o tema “Hippie”, incluindo servidores caracterizados, músicas, decorações e encenações típicas de um momento de celebração. 

Os registros da festa foram publicados por meio de vídeo, em redes sociais, cujos perfis dos servidores e colaboradores da Secretaria da Fazenda são indicados. 
Além de identificar a presidente Comissão Setorial de Ética Pública – que assinou a recomendação nº 05/2022 – na festa, devidamente caracterizada, o vídeo deixa claro que a comemoração ocorreu em repartição pública (há elementos de reconhecimento do local, como as placas nas portas, estações e armários), com servidores e colaboradores do órgão fantasiados de acordo com a temática. 

Também é possível visualizar o uso de material de expediente com o timbrado da Secretaria da Fazenda, um convidado utilizando crachá e até “brincadeira” de apologia ao uso de substância proibida (um indivíduo surge no vídeo com um papel enrolado na boca simulando o ato de fumar), sobretudo, em repartição pública.

Na legenda da publicação, que ocorreu em formato de “Reels”, há a descrição no perfil pessoal da servidora, do local do evento “Coordenadoria de Relações Institucionais da Sefaz”, ou seja, órgão público, inclusive com menção dos convidados: 

Comemoração do meu aniversário com minha equipe maravilhosa da Coordenadoria de Relações Institucionais da Sefaz. ❤️ Com o tema “hippie”, propagamos todo o amor, alegria e paz que acreditamos ser essencial para todos nós. Gratidão a cada um de vocês pela partilha diária dos desafios e das conquistas. Amo vocês 🥳🥰, escreveu a usuária da rede social, que está identificada em seu perfil, como “Servidora pública da Sefaz-CE”.

A Auditece não está fazendo julgamento do referido caso, mas se preocupa, e muito, com a forma como a Recomendação nº 05/2022 será aplicada e para quem será aplicada - se a todos os servidores indistintamente ou não se aplicaria, por exemplo, à Coordenadoria de Relações Institucionais da Sefaz.

Vale ressaltar que por muito, muito menos, vários AFREs foram alvos de sindicâncias, que deixaram marcas indeléveis em suas vidas públicas e privadas, para resultarem em nada. Todos os processos foram arquivados ou tiveram a absolvição como desfecho.

Não deixemos que esse documento venha a se tornar uma arma de perseguição. Recomendações de conduta devem ser claras no sentido de padronizar os valores e as posturas; devem dirimir dúvidas para que os servidores entendam como agir em diferentes situações e ambientes. Conforme exemplo citado neste artigo, a Recomendação nº 05/2022 não foi suficientemente clara e nem mesmo contou com ampla discussão e participação do corpo de servidores para sua construção. 

Contudo, a sugestão da Auditece para a gestão da Secretaria da Fazenda é que em vez de definir normas genéricas, invista de forma assertiva na cultura, nos valores, na gestão de pessoal e que valorize, sem distinção, o corpo técnico de excelência que possui, que pode a todo momento contar com sua ampla participação na construção de novos normativos.

A Diretoria Colegiada


 

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