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As ideias defendidas nos artigos publicados neste Blog são de responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem a posição institucional da Auditece.

 

Publicado em: 31/08/2021

Trabalho Remoto na Administração Pública

A pandemia de 2019 impôs, e continua a impor – a uma infinidade de instituições públicas e privadas – a adoção de medidas inovadoras para continuar a atender seus respectivos usuários. A Administração Pública brasileira, contudo, deve seguir rígidos Princípios Constitucionais e infraconstitucionais para entregar à sociedade cada vez mais serviços demandados, tanto em quantidade quanto em qualidade.

A partir da série de medidas de restrição à mobilidade e atendimento presencial, restou ainda mais evidente a necessidade de a Administração Pública reavaliar, redimensionar e aperfeiçoar sua rede de atendimento ao cidadão-usuário do serviço público.

A adoção de medidas legalmente previstas de Governo Digital fornece ainda mais alinhamento aos Princípios da Administração Pública do que o antigo modelo de atendimento presencial, prestado - de forma concentrada - nos grandes centros urbanos. Se o Estado privilegia o atendimento presencial exclusivamente nos grandes centros, passa a tratar os que vivem em pequenas cidades como cidadãos de segunda categoria, sem acesso às facilidades que a Administração somente disponibiliza nas capitais e regiões mais adensadas.

Toda prestação de serviço público ocorre da relação desenvolvida pela Administração Pública com o cidadão. Trata-se de um dever essencial do Estado Moderno. O Titular do Serviço Público é o Estado, por meio da Administração Pública, e o destinatário é o Cidadão-Usuário. O Cidadão-Usuário não é, nem pode ser tratado pelo termo ‘consumidor’. O Cidadão se constitui, pois, na essência e razão de existir do Estado Moderno.

Em pleno século XXI, ainda imersos em uma pandemia, a forma de que dispõe a Administração Pública para prestar atendimento disponível é a modalidade eletrônica. A disseminação da Internet e o acesso da população a smartphones tem o potencial para suportar o atendimento junto às pessoas físicas, a partir das mais variadas aplicações. Relativamente ao atendimento de pessoas jurídicas, a Administração já consolidou a modalidade eletrônica como regra, tendo em vista a variedade de serviços digitais prestados há décadas, permanentemente aperfeiçoados.

O Brasil tem mais de 5.500 (cinco mil e quinhentos) municípios. É forçoso reconhecermos que a Administração Pública não está fisicamente presente, com atendimento burocrático, sequer em 10% dessas cidades, prestando serviços na modalidade presencial.

Contudo, essa aparente lacuna é preenchida com a prestação de serviços a partir de ferramentas de Governo Digital.

A prestação de serviços pelos canais digitais se transforma, pois, em medida essencial que garante a prestação de uma significativa parcela de serviços públicos que devem ser disponibilizados ao Cidadão-Usuário.

Excetuando-se aqueles serviços que não podem ser prestados na modalidade remota, por exigirem contato físico, como alguns serviços de saúde, por exemplo, há uma variedade de serviços que podem e devem ser ofertados por meio da Estratégia de Governança Digital, composta de três eixos, a saber: acesso à informação, prestação de serviços e participação social.

Os princípios e diretrizes de Governo Digital, previstos na Lei Federal No. 14.129/2021, abordam regras e instrumentos para o aumento da eficiência pública:

  • A desburocratização, a modernização, o fortalecimento e a simplificação da relação do poder público com a sociedade, mediante serviços digitais, acessíveis;
  • A disponibilização em plataforma única do acesso às informações e aos serviços públicos;
  • A interoperabilidade de sistemas e a promoção de dados abertos;
  • O incentivo à participação social no controle da administração;
  • A eliminação de exigências e formalidades;
  • O apoio técnico aos entes federados para implantação e adoção de estratégias que visem à transformação digital da administração pública;  

A referida lei federal define também os direitos do Cidadão-Usuário da prestação digital de serviços públicos, listando instrumentos necessários para as plataformas de governo digital de uso de cada ente federativo 

Dentre as determinações da Lei de Governo Digital, há que se destacar a de que a Administração Pública participe, de modo integrado e cooperativo, da Estratégia Nacional de Governo Digital, editada pelo Poder Executivo Federal. A projeção é de que o Governo do Futuro será: Centrado no cidadão; Integrado; Inteligente; Confiável; Transparente e aberto; e Eficiente.

Observa-se, portanto, que já existe não só a previsão legal para oferta de serviços públicos pelos canais digitais, como essa via passa a ser considerada regra, visando democratizar o acesso de todos os brasileiros à Administração Pública, elevando o nível de penetração do atendimento, que não pode ficar restrito aos grandes centros urbanos.

O trabalho e o atendimento remoto se harmonizam e se alinham aos Princípios Constitucionais e infraconstitucionais aplicáveis à Administração Pública, bem como às Estratégias de Governança Digital, se constituindo em medida de democratização da razão de ser do Estado, que é a prestação de serviços ao Cidadão-Usuário.

O atendimento digital atende ao Princípio Constitucional da Legalidade, tendo em vista que já existe Lei expressa determinando princípios e diretrizes para tal medida. Cumpre com o mandamento da Impessoalidade, uma vez que confere à Administração a capilaridade capaz de levar a todas as cidades um atendimento ágil, disponível 24 horas por dia, 7 dias por semana, dotado das ferramentas de acessibilidade previstas na legislação aplicável.

A prestação de serviços – por parte da Administração Pública – a partir do uso de ferramentas de Governança Digital atende também o Princípio da Continuidade do Serviço Público que, parte do pressuposto que esses referidos serviços não podem ser interrompidos, tendo em vista sua natureza e relevância.   

Uma eventual defesa de que o atendimento pessoal/presencial se faz necessário não se sustenta, tendo em vista que essa modalidade de tratamento só está disponível em poucas localidades do estado, além de se submeter a horários previamente limitados de atendimento, o que acentua tratamento discriminatório e desrespeitoso ao cidadão, enquanto razão de ser do Estado.

Se a Constituição assegura em seu Art. 5º que “todos são iguais perante a lei”, então a modalidade de atendimento à população – por parte da Administração Pública – deve privilegiar as ferramentas e conveniências mais acessíveis, especialmente às comunidades mais afastadas dos grandes centros.

O trabalho remoto, desenvolvido por servidores públicos não só é possível, como necessário. A pandemia demonstrou não só a viabilidade, como foi possível aferir o aumento da produtividade, a partir do uso inteligente das ferramentas de gestão por processos amplamente difundidas e até já acolhidas pela Administração Pública. O trabalho remoto se constitui, pois, em uma necessidade, especialmente enquanto ainda convivemos com uma significativa gama de variantes da doença que continua a ceifar milhões de vidas no mundo e sobremaneira no Brasil, que tem o maior número de mortes por Covid-19 em relação à sua população, conforme aponta o “Our World in Data”.

O trabalho remoto se constitui também em instrumento que confere ao gestor público um elevado grau de segurança e transparência quanto ao controle de produtividade por processos. Tendo em vista que a Administração Pública já trabalha com estabelecimento de metas, a viabilização de rotinas de trabalho remoto se adequa perfeitamente às exigências legais.

As medidas de aperfeiçoamento que integrem serviços disponibilizados na modalidade digital são, portanto, aderentes aos Princípios da Administração Pública. A manutenção de servidores públicos em regime de trabalho remoto até que a pandemia venha a ser plenamente debelada se constitui em medida de segurança sanitária que preserva vidas, o bem jurídico mais valioso a ser resguardado pelo Estado.

São essas as nossas considerações, em homenagem ao múnus público que abraçamos como Servidores Públicos, sempre com nossa atenção, inteligência e diligência voltados à prestação de serviços de excelência à sociedade que, com muito esforço, contribui com sua parcela em forma de tributos para receber o produto em forma não só de serviços, como de investimentos nas mais diversas áreas que muito justificadamente demanda.

 

 

 

Autores
Juracy Braga Soares Junior
Administração Pública Serviço público Fisco