Lei anticorrupção não pega em empresas
Seis em cada dez empresas não estão preparadas para cumprir a lei anticorrupção no Brasil, que entrou em vigor há quase um ano e pune, com multas de até 20% do faturamento bruto, empresas envolvidas em fraudes de contratos públicos.
Levantamento com 300 companhias brasileiras, feito pela consultoria internacional Grant Thornton, mostra que a maioria das empresas não adotou ainda medidas de controle interno para aumentar a transparência ou regras para treinar funcionários e punir infratores.
São empresas de várias regiões e setores, em sua maior parte de médio porte e localizadas em São Paulo e Rio.
"O Brasil é um país que reage à corrupção, mas não tem cultura de prevenção", diz Cynthia Catlett, sócia responsável pela área de investigação de fraudes da consultoria.
"As empresas estão em compasso de espera, uma vez que a lei ainda não foi regulamentada. Por isso, a necessidade de a lei ser aplicada e as punições de fato existirem, como ocorre nos EUA, o país com uma das leis mais temidas de combate à corrupção."
O texto do decreto que vai regular a lei anticorrupção está em análise na Casa Civil desde o primeiro semestre.
Segundo o ministro Jorge Hage, da Controladoria-Geral da União, poucos detalhes faltam ser acertados, como o peso dos critérios na aplicação das punições (leia à pág. B3).
Um dos pontos que as empresas precisam reforçar em seus programas de combate à corrupção é a relação com parceiros comerciais e fornecedores, segundo advogados e especialistas em "compliance" (mecanismos internos para prevenção de ilícitos).
Luciano Malara, diretor jurídico e de "compliance" da Dell, diz que há anos a empresa tem cláusulas que permitem fazer auditorias e investigar parceiros, no caso de procedimento suspeito: desde uma nota fiscal rasurada a um pagamento feito à pessoa física em vez de à jurídica.
Nos EUA, os dez principais casos investigados e punidos pela Justiça envolveram problemas com terceiros.
Entre as empresas que no estudo informaram ter adotado alguma medida para cumprir a lei (32,4%), a fiscalização "sistemática" da relação com fornecedores é um dos itens citados, ao lado de investimentos em sistemas de tecnologia da informação.
Uma companhia do ramo financeiro relatou que demitiu um funcionário após constatar, ao monitorar e-mails, que ele comentou dados sigilosos com um terceiro.
Na Serasa Experian, um funcionário foi demitido após postar em uma rede social uma foto de um gato deitado em cima do notebook da companhia e informar que tinha encerrado o expediente, enquanto trabalhava de casa.
"O problema é a imagem que o ato transmitia", diz Rogeria Gieremek, consultora do programa de "compliance" da Serasa Experian. "Ética e licitude não estão nos grandes atos, mas no dia a dia."
Fonte: Folha de S. Paulo