INSTABILIDADE - Ação descompassada do Congresso amplia crise
Deputados admitem a responsabilidade do Parlamento na crise econômica, mas não chegam a um consenso
No centro de uma crise política que agrava cada vez mais a economia, o País presencia incertezas institucionais para os próximos meses amplificadas após a instauração do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Entrevistados pelo Diário do Nordeste, deputados federais cearenses reconhecem a mea-culpa do Congresso Nacional quanto ao atual cenário, mas divergem sobre as saídas para atenuar a crise. A oposição atribui a instabilidade político-econômica ao Governo Federal e aliados apontam oportunismo de setores oposicionistas.
Na última quarta-feira, o presidente da Câmara Federal, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acatou pedido de impeachment contra a presidente da República assinado pelo advogado Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT, sob a justificativa de crimes de responsabilidade fiscal da gestora. Cunha resolveu acatar o pedido depois de confirmar que os deputados petistas votariam pela continuidade do processo que tramita contra ele no Conselho de Ética da Casa.
Convidado a apontar de que forma o Parlamento pode contribuir para arrefecer a crise política, o deputado federal José Airton Cirilo (PT) afirma que os congressistas devem "acabar com a hipocrisia". O petista diz que legendas oposicionistas, como o PSDB e o DEM, acusam o Governo Federal de erros que, segundo o deputados, as agremiações já cometeram também.
"Esses caras se acham no direito de esculhambar e pregar a moralidade. Estamos vivendo uma hipocrisia nunca vista antes na história do País, do sujo falar do mal lavado", ressalta. "O parlamento está virando um verdadeiro circo em função das pessoas que não têm um mínimo de escrúpulos, que não têm, na minha ótica, moral para denegrir os outros", acrescenta.
Escândalos
O petista se refere aos escândalos da Operação Lava Jato, que apuram desvios de recursos da Petrobras, envolvendo diretores da estatal, políticos, empresários e doleiros. José Airton relata que empreiteiros investigados ou presos por contratos fraudulentos nos governos Lula e Dilma participaram da gestão Fernando Henrique Cardoso e fizeram doações para campanhas eleitorais de tucanos. "O impeachment faz parte de uma estratégia de um tremendo golpe, uma chantagem dos que não aceitam o jogo político e democrático das urnas", alega.
O deputado federal Raimundo Gomes de Matos (PSDB) avalia que a crise é mais política do que administrativa. "Existe um cenário incerto no aspecto econômico e político agravado com a não aprovação da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e do Orçamento e, fatalmente, defendo que deveríamos cancelar o recesso", opina.
O PSDB havia declarado posição de reforçar os pedidos pela saída de Eduardo Cunha da presidência da Câmara após a comprovação de que o parlamentar possui contas na Suíça que não foram declaradas. Apesar de negar que o PSDB possa recuar da posição contra Eduardo Cunha após o dirigente deflagrar o processo de impeachment, Gomes de Matos ressalta que a saída do peemedebista pode atrasar a votação de matérias relevantes no Congresso Nacional.
Consenso
"Isso vai dificultar a aprovação de Medidas Provisórias, a não ser que haja consenso para a eleição de um novo presidente. E não vejo cenário nenhum de consenso", salienta, completando que a permanência de Dilma Rousseff no cargo também não contribui para a retomada do crescimento do Brasil.
"A estabilidade para o País tem que buscar uma figura para dar estabilidade. Eu indago ao povo brasileiro: a Dilma garante essa estabilidade?", questiona. "Pelo que foi lido por mais de três horas (no plenário da Câmara Federal acerca do pedido de impeachment), eu não considero golpe. É claro que o presidente da Câmara Federal poderia ter acolhido (o pedido de impeachment) antes desse problema dele. Infelizmente, ele só acolheu depois do processo contra ele", completa o tucano.
Já o deputado Domingos Neto (PMB) tem opinião contrária. Ele destaca que a permanência da presidente Dilma Rousseff e a saída do dirigente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, estão entre os caminhos para arrefecer a crise nos próximos meses.
"Sem dúvida, há instabilidade, a existência do processo de impeachment já cria dúvidas. E a permanência dele (Cunha) no cargo só fortalece a instabilidade, porque ele representa uma posição declarada de ameaça política ao Executivo. Ele já se posicionou de forma emocional, vingativa em posição contrária a presidente da República", analisa o congressista.
Irresponsável
Para Domingos Neto, a tentativa de tirar Dilma Rousseff do poder é uma ação do que ele chama de "oposição irresponsável". "O custo da crise política não precisa ser de quebrar o País", reforça o parlamentar. "Temos que ser um contrapeso nessa balança de estabilidade institucional, precisamos dar segurança que a crise política não afetará projetos importantes para a nação", acrescenta o deputado.
Domingos Neto admite não haver uma liderança hoje capaz de alcançar consenso para presidir a Câmara Federal. No entanto, ele acredita no poder de mediação de um congressista de centro para a direção da Casa. "No cenário atual, numa nova eleição de presidente da Câmara, é difícil eleger um nome de consenso, mas precisa ter diálogo. A oposição mais irresponsável está adorando essa instabilidade porque enfraquece o papel do Governo. Precisa ter alguém de centro para dialogar", diz.
O deputado federal Chico Lopes (PCdoB) ressalta que falta à oposição apresentar um projeto de consistência em alternativa a ações que vêm sendo tomadas pelo Governo Federal. Segundo ele, partidos políticos opositores estão agindo contra Dilma Rousseff, mas de forma não propositiva. "Se não querem a CPMF, então apresentem outra coisa. Só querem cassar", critica o deputado da base governista.
Chico Lopes aponta não ser coerente o presidente da Câmara acatar pedido de impeachment da presidente da República quando ele próprio responde a processo no Conselho de Ética da Casa que pode resultar na cassação do mandato do dirigente. "Ele toma uma atitude perto de vingativa, isso não funciona em política", pontua. PSOL, Rede Sustentabilidade e PDT já se manifestaram contra o impeachment de Dilma Rousseff.
Fonte: Diário do Nordeste