Pular para o conteúdo principal

Publicado em: 16/04/2014

Categoria

Editorial: Temeridade fiscal

16/04/2014.

É um tanto estranha a passividade recente do governo federal na tramitação do projeto de lei complementar que muda os encargos financeiros das dívidas dos Estados e municípios.

Aprovado pela Câmara dos Deputados no ano passado, o projeto passou nesta semana por comissões do Senado e segue para o plenário. A alteração principal, e a mais polêmica, é a redução dos juros de forma retroativa.

No ano passado o Planalto chegou a patrocinar a iniciativa, para aliviar em especial a Prefeitura de São Paulo, com óbvio objetivo eleitoral. A deterioração das contas públicas, porém, forçou um recuo.

Agora, novamente, o Congresso se move sem que se perceba objeção do Executivo. À luz da baixa credibilidade atual da política econômica, é temerário passar a impressão de que se aceita um afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Entre 1997 e 2000, a União assumiu as dívidas de Estados e municípios, que se comprometeram com várias metas fiscais. O pagamento do débito seria em 30 anos, com reajuste pelo IGP-M mais juros que variam de 6% a 9% ao ano.

Se aprovado, o projeto mudará o indexador, a partir de janeiro de 2013, para IPCA mais 4% ao ano, ou para a taxa básica Selic –o que for menor. Ademais, o saldo devedor será recalculado desde o início dos contratos com base na Selic.

O resultado será um belo desconto no valor principal, para alguns casos. Estima-se que a dívida da Prefeitura de São Paulo, que paga juros de 9% ao ano além da correção monetária, cairia de R$ 54 bilhões para R$ 30 bilhões. Haveria, assim, espaço para a tomada de novos empréstimos.

A redução dos juros tem sua razão de ser, pois são muito elevados para o padrão atual da economia. É correta, portanto, sua revisão –daqui para a frente.

A mudança retroativa, contudo, é preocupante, pois estimula endividamento adicional. A dívida consolidada do setor público crescerá. A mensagem de frouxidão nas contas torna-se clara.

A despeito dos méritos eventuais do projeto, o momento não é propício. Além da insegurança que reina na economia, o ano é de eleições, e ajustes protelados cobrarão seu preço em 2015. Será necessário um forte aperto orçamentário, e não apenas do governo federal.

Estão pendentes, ainda, outras matérias que envolvem relações entre os entes da Federação, como a reforma do ICMS e os critérios de partilha, o que certamente demandará recursos da União.

O ideal é considerar esses assuntos de forma integrada. Quanto às dívidas, o melhor é aguardar e voltar ao tema após o pleito.

Fonte: Folha Online (Jornal Folha de S. Paulo)