Ata do Copom reforça dúvida sobre choque de credibilidade e dólar sobe
SÃO PAULO - As persistentes dúvidas sobre a disposição do governo em promover um “choque” de credibilidade voltam a pesar sobre os ativos domésticos nesta quinta-feira, especialmente após a divulgação da ata da última reunião do Copom, que frustrou expectativas de um tom mais “duro” contra a inflação.
De acordo com analistas, o principal tópico do documento foi a sinalização de que a desvalorização da taxa de câmbio orientou a inesperada alta da Selic na semana passada. Ainda assim, não se viram na ata elementos que sugerissem um ciclo de aperto monetário mais vigoroso, o que para o mercado poderia soar como uma tentativa de reconquista da credibilidade perdida.
No mercado de câmbio, o dólar sustenta uma forte alta ante o real e já superou a marca de R$ 2,55, próximo dos maiores patamares em quase seis anos. Operadores comentam que a demanda comprada tem vindo sobretudo de estrangeiros, em parte pela leitura de que o eventual ciclo de aperto monetário a ser promovido pelo Banco Central pode ser menos intenso e duradouro que o imaginado, o que reduziria a vantagem de se aplicar em reais.
Às 13h58, o dólar comercial subia 1,21%, para R$ 2,5453, depois de alcançar R$ 2,5519 na máxima, maior patamar desde os R$ 2,5603 da segunda-feira da semana passada, quando os mercados reagiram à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT).
No mercado futuro, o dólar para dezembro tinha alta de 1,52%, para R$ 2,5650, após alcançar R$ 2,5685.
Juros
O comportamento do câmbio e o teor da ata do Copom, considerado mais "dovish" (inclinada a uma política monetária acomodatícia) do que o esperado, nortearam o mercado de juros nesta manhã. O principal efeito desses dois elementos é percebido na curva a termo, cuja inclinação diminuiu, em uma demonstração de cautela por parte dos agentes. O degrau entre o DI janeiro/2017 e o janeiro/2021 chegou ao início da tarde em -0,17 ponto, ante -0,24 ponto ontem.
A leitura da ata do Copom conferiu ao câmbio uma importância ainda mais nas apostas para o rumo da política monetária. Para Fernando Honorato, economista-chefe do Bradesco Asset Management (Bram), o Copom coloca o câmbio como o principal “culpado” da alta de juros e atribui à sua evolução o rumo da política monetária. Ele diz que o documento não traz elementos que confirmem que há um ciclo de alta de juros em curso, como ocorreu em outros momentos. Em vez disso, adotou um tom de “calibragem”, imposto pela mudança no nível do dólar - que saiu de R$ 2,25 para R$ 2,50 no cenário de referência do BC.
Agentes observam, entretanto, que, além do alerta sobre o câmbio, houve poucos sinais que apontem para taxas mais elevadas. “No cenário traçado pela ata, o BC não indica estar vendo uma explosão da inflação, mesmo com a alta do dólar”, diz Tony Volpon, diretor da Nomura Securities. “Não tem nada gritando urgência”.
Na BM&F, DI janeiro/2016 operava a 12,35%, de 12,32% ontem. DI janeiro/2017 subiu de 12,43% para 12,52% e o DI janeiro/2021 de 12,19% para 12,35%.
Bolsa
O Ibovespa tem mais um dia de baixa, depois da queda de 1,26% de ontem, e o mercado está mais “azedo”, diz o estrategista da Fator Corretora, Paulo Gala. O índice caía 1,86% às 13h59, para 52.897 pontos, e as blue chips têm perdas consistentes. A pior performance é de Petrobras PN, que perde 2,71%, mas Vale PNA recua 1,83%, Itaú perde 2,63% e Bradesco cai 1,17%.
Para o economista-chefe da Órama Investimentos, Álvaro Bandeira, pesa a “falta de notícias, a inação do novo mandato” de Dilma Rousseff na presidência da República. Segundo ele, o mercado se ressente da indefinição em relação a nomes-chave da economia. Hoje, o Valor informa que a presidente não tem pressa para anunciar o nome do novo ministro da Fazenda, segundo fontes oficiais.
Além disso, não chega o tão esperado aumento de combustíveis. A Petrobras informou ontem que até o momento a orientação do conselho de administração da companhia tem sido pela manutenção dos níveis de preços da gasolina e do diesel e afirmou que não há data ou percentual definidos para um reajuste. Para Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora, governo e empresa esperam efeitos da política monetária sobre a economia para decidir quando elevar os preços. Mas ele acredita o ajuste será feito.
No Ibovespa, Banco do Brasil lidera as baixas, com queda de 4,57%, depois de divulgar um balanço abaixo do esperado pelo mercado ontem. Já a maior alta é de Santander Unit (+5,23%). As ações sobem depois que o banco anunciou que reabrirá seu programa de recompra de units. Até então, as ações vinham caindo, após oferta de recompra de ações da subsidiária brasileira feita pelo Santander Espanha.
Mercados internacionais
O Banco Central Europeu (BCE) manteve sua política monetária nesta quinta-feira, como esperado pelos analistas. Mas o presidente do BCE, Mario Draghi, deu declarações sinalizando que a instituição está disposta a ampliar o afrouxamento monetário, em um discurso “dovish” (inclinada a uma política monetária acomodatícia) que animou os mercados acionários. Em seu comunicado oficial, Draghi afirmou que a expectativa é de que o balanço do BCE volte aos níveis de 2012 e que, se necessário, o conselho do banco adotará medidas adicionais para enfrentar o quadro de inflação muito baixa e crescimento anêmico na zona do euro.
Draghi disse que a expectativa é de que a inflação continue baixa nos próximos meses na zona do euro, mas deve acelerar gradualmente em 2015 e 2016. Segundo o presidente do BCE, não houve na reunião um debate sobre instrumentos adicionais específicos, mas há uma série desses instrumentos que podem ser usados mais adiante, se preciso.
As bolsas europeias reagiram positivamente ao discurso, enquanto o euro chegou a recuar à mínima em dois anos. Por volta das 12h55 (de Brasília), a Bolsa de Londres subia 0,20%, Frankfurt avançava 1,12% e Paris tinha alta de 0,82%. O euro recuava a US$ 1,2439, após chegar mais cedo a US$ 1,2394 – pela primeira vez desde agosto de 2012 abaixo da marca de US$ 1,24.
O Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) também decidiu manter sua política monetária, como esperado. Na agenda de indicadores do Reino Unido, a produção industrial avançou 0,6% em setembro ante o mês anterior, acima da previsão de alta de 0,4%.
Por volta das 12h55, o índice Dow Jones subia 0,05%, o Nasdaq caía 0,03% e o S&P 500 recuava 0,13%. Ontem, o Dow Jones e o S&P 500 fecharam em níveis recordes de valorização. O dólar recuava a 114,58 ienes. Entre os Treasuries, o juro da T-note de 10 anos avançava a 2,360%, de 2,350% no fim da quarta, enquanto o juro do T-bond de 30 anos subia a 3,081%, de 3,064% ontem.
Fonte: Valor Econômico