Pular para o conteúdo principal

Publicado em: 15/07/2015

Um tesouro bilionário perdido no Estado

Dívidas tributárias acumuladas ao longo de décadas deixaram ao Rio Grande do Sul uma herança dúbia. À beira do colapso financeiro, o Estado contabiliza R$ 36 bilhões em dívida ativa, nome que se dá aos débitos de pessoas e empresas com o governo, a maioria por não pagar impostos ou por questioná­-los na Justiça.

Em teoria, a cifra seria suficiente para colocar as contas do Palácio Piratini no azul. Mas a realidade é outra. A média anual de recuperação é de R$ 1,1 bilhão, o equivalente a 2,8% do passivo – valor insuficiente para amenizar a situação de penúria do Estado.

O problema é que dois terços do passivo, segundo a Receita Estadual, já estão perdidos. Com registros que começam em 1965, não passam de papelada envelhecida.– Lamentavelmente, essa parcela da dívida acabou se tornando incobrável em face do tempo que passou. É fácil alardear que a solução da crise passa pela recuperação desses valores, mas não podemos simplesmente expropriar bens. Não temos esse poder. Fazemos o que é legalmente possível – diz o secretário adjunto da Fazenda, Luiz Antônio Bins.

Dos R$ 25 bilhões em moeda podre, mais da metade é objeto de ações que tramitam na Justiça. Integra o bolo processos envolvendo companhias como J.H. Santos, Imcosul e Hermes Macedo, que já não operam mais. Mesmo em casos de falência, quando não restam bens penhoráveis, o juiz não pode simplesmente extinguir as ações. Pode, no máximo, suspendê-las.

O prazo de prescrição dos débitos é de cinco anos, mas, enquanto o caso estiver suspenso, a contagem é congelada, e o Estado deve prosseguir nas buscas (por sócios, sucessores e valores que possam ser bloqueados). É por isso que processos antigos, com mais de 20 anos, continuam abertos e sem solução. Acabam em uma espécie de limbo jurídico, inflando artificialmente a dívida.

– Muito do que restou do passado tem a ver com a questão tecnológica. Tudo era mais lento. Hoje, existe preocupação em agilizar os processos – diz a juíza Alessandra Abrão Bertoluci, da 6ª Vara da Fazenda Pública, na Capital.Em 2010, por iniciativa da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), foi aprovada lei que autoriza o órgão a desistir das causas inviáveis. Desde então, todas elas (cerca de cem mil) estão sendo reavaliadas, e mais de 10 mil foram extintas nos últimos três anos.

– Decidimos fazer um filtro. O que queremos é que o Judiciário coloque todo o empenho nos processos de maior viabilidade. Do contrário, os que realmente têm chance de retorno acabam sendo prejudicados – diz o procurador­geral adjunto para Assuntos Administrativos da PGE, Cristiano Xavier Bayne.

ENTIDADE APONTA FALTA DE AUDITORES

Mas quanto, afinal, ainda pode ser recuperado? Via tribunais, cerca de R$ 9 bilhões. Via Receita, outros R$ 2 bilhões. A soma nem de longe é desprezível. A título de comparação, equivale a 28 vezes o valor aplicado em investimentos em 2014, com recursos do Tesouro estadual. É o dobro do déficit (quando o gasto é maior do que a receita) previsto para este ano.

Só que o retorno não é automático. Depende da celeridade da PGE e do Judiciário, que leva, em média, oito anos para julgar ações de execução fiscal, e da agilidade dos auditores da Receita Estadual, cujo número vem caindo devido a aposentadorias sem reposição.Apenas 40 trabalham na cobrança dos devedores, em um universo de 337,7 mil créditos tributários no âmbito administrativo.

– A defasagem de auditores é preocupante. Se houvesse um número maior, os resultados seriam melhores, não só na ampliação dos valores recuperados, mas na fiscalização, que é muito importante. Quando não existe percepção de risco, a sonegação aumenta – alerta o presidente da Associação dos Fiscais de Tributos, Altemir Feltrin da Silva, que defende a nomeação imediata de cem concursados aprovados em 2014.

Se for mantido o ritmo atual de cobrança, mesmo que a dívida parasse de crescer, seriam necessários pelo menos 10 anos para reaver os R$ 11 bilhões passíveis de resgate. E, ainda assim, sem garantia de êxito.

Leia mais em www.afisvec.org.br

 

Fonte: Afisvec