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Publicado em: 23/05/2016

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Revisão de decretos levanta debate sobre impactos para o Ceará

Ao todo, 75 atos tomados pela gestão do PT serão analisados, incluindo medidas que atingem o Estado

Desapropriações de terras, reajuste de 9% no Bolsa-Família, assinatura de contratos do "Minha Casa, Minha Vida", prorrogação de permanência de profissionais estrangeiros do "Mais Médicos", seleção de sete municípios para receber novos cursos de Medicina e até a liberação de R$ 619 milhões para o Cinturão das Águas.

Essas foram algumas das medidas, que afetam diretamente o Ceará, tomadas pela presidente afastada Dilma Rousseff (PT), em seus últimos 42 dias de gestão, antes da admissibilidade do processo de impeachment.

As ações acima citadas fazem parte de um conjunto de 75 decretos assinados por Dilma, entre os dias 1º de abril e 12 de maio, quando foi afastada pelo Senado por até 180 dias, que serão analisadas e, eventualmente revogadas, pelo presidente em exercício, Michel Temer (PMDB). A iniciativa faz parte de uma ofensiva do peemedebista para explicitar eventuais erros da gestão de sua antecessora.

Na última quarta-feira (18), a equipe econômica de Temer divulgou uma estimativa de rombo de R$ 150 bilhões nos cofres públicos e a revisão de alguns desses decretos, na interpretação governista, poderia representar algum alívio financeiro.

Contudo, políticos cearenses ouvidos pelo Diário do Nordeste divergiram quanto aos impactos que tais revisões terão sobre programas e obras federais em curso no Estado.

Minha Casa, Minha Vida

Segundo o líder da bancada do Ceará na Câmara dos Deputados, José Airton (PT), "o maior impacto imediato para o nosso Estado pode vir da portaria 173/16 que o ministro das Cidades, Bruno Araújo, assinou, cortando recursos do Minha Casa, Minha Vida, na modalidade 'Entidades'. Isso, na verdade, traz um retrocesso e vai de encontro aos interesses da sociedade". O petista, que admitiu a possibilidade de deixar a liderança estadual na Casa, avaliou como "uma medida muito ruim revogar a construção de quase 11,3 mil unidades habitacionais", do programa. No dia 6 de maio, Dilma anunciou a contratação de 25 mil casas para 100 mil sem-tetos e camponeses, dentro da modalidade do programa voltada para movimentos sociais. "São grupos de pessoas que tem um trabalho social muito", afirmou.

Já para o deputado federal Raimundo Gomes de Matos (PSDB), ao contrário, é "fato preocupante que o Ministério das Cidades, no apagar das luzes da gestão de Dilma, tenha liberado recursos para que o MST e outras ONGs façam casas. Isso precisa ser visto com ética".

Ele acrescentou que houve uma série de desapropriações para reforma agrária, desde abril, em proporção maior que a realizada nos 51 meses anteriores do governo da petista.

As terras desapropriadas somam, no total, 35,5 mil hectares em 14 estados, incluindo o Ceará. "Temos de ver se as áreas desapropriadas passaram por uma avaliação rigorosa. E em caso contrário, temos (a Câmara) a possibilidade regimental, através dos PDCs (Projetos de Decreto Legislativo de Sustação de Atos), de rever iniciativas que foram feitas sem a devida necessidade", argumentou.

Obras de infraestrutura

Entre decretos e outras ações de Dilma, sob análise da gestão Temer, estão obras de infraestrutura. No Ceará, por exemplo, o governador Camilo Santana anunciou, no dia 2 de maio, que a presidente Dilma Rousseff havia garantido a destinação de R$ 619 milhões para a conclusão do primeiro trecho (de 146km) do Cinturão das Águas do Ceará, obra de segurança hídrica que prevê a construção de canais e túneis integrando as 12 bacias hidrográficas estaduais. Os recursos foram previstos para o Orçamento Geral da União de 2017. No primeiro trimestre deste ano, foram liberados para a obra, que faz parte do Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC), pouco mais de R$ 34 milhões. Conforme José Airton, a revisão de decretos feita pela atual gestão federal ameaça mesmo o conjunto de intervenções do PAC, no Ceará. "Esse programa tem uma capilaridade muito grande em nosso estado. Ele envolve a construção de escolas, quadras, aeroportos, obras de saneamento, entre outras. No Ceará, todos os municípios têm a presença do PAC. Seria um impacto negativo muito grande reduzi-lo ou extingui-lo", criticou.

A avaliação do petista, é rebatida por Matos. "Mesmo tendo ministros nos governos de Lula e Dilma, o Ceará não conseguiu ter a reciprocidade do apoio que deu a essas gestões. Não veio dinheiro para o nosso aeroporto de Fortaleza e outras obras importantes. Não avançamos na Transposição do Rio São Francisco, na construção do Anel Viário, ou na reforma das nossas BRs, nem tivemos melhorias na nossa saúde. Não veio também dinheiro para o nosso Metrô", enumerou. O tucano disse ainda que a presidente Dilma Rousseff "teve vários anos para tomar essas ações e resolveu fazê-las só agora, talvez até para desestabilizar o novo governo".

Recursos em 2016

Uma análise dos dados do Portal da Transparência, ligado à extinta Controladoria-Geral da União (CGU), hoje Ministério de Fiscalização, Transparência e Controle, sobre repasses feitos pelo governo federal ao governo do Estado do Ceará mostra que algumas áreas receberam mais recursos no período que antecedeu as votações do processo de admissibilidade do impeachment na Câmara e, posteriormente, no Senado, mas também que outras áreas não receberam recursos, no mesmo período comparado.

As áreas de segurança pública, urbanismo, trabalho e cultura não receberam repasses federais em março deste ano, último mês com dados divulgados pelo portal. Já as áreas de desporto e lazer, agricultura e organização agrária só tiveram os primeiros repasses feitos ao Ceará exatamente em março. Já dados da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social do Ceará (STDS-CE), mostram que o Bolsa-Família, teve redução de quase 12 mil beneficiários no mês de abril (dados mais recentes), quando comparado com o acumulado de beneficiários do primeiro quadrimestre de 2016.

Fonte: Diário do Nordeste